Ilustração Celeste Berlier |
Vou
parecer maluca. Talvez essa seja uma ideia maluca mesmo.
Não é a primeira vez que
vejo um autor afirmar que a história que escreveu não é sua. Que a
história existe para além dele.
A J. K. Rowling conta
que toda a história do Harry Potter chegou para ela durante uma viagem de trem.
Sim, chegou.
A Elizabeth Gilbert
relata no seu último livro, A Grande Magia, um acontecimento semelhante,
quando um enredo de um livro chegou até ela. Na época não pode escrevê-lo
e a história, segundo a própria Gilbert, acabou abandonando. Anos depois ela
conheceu uma moça, num congresso, que à época escrevia a mesma
história que a tinha abandonado anos atrás.
A história encontrou um
novo autor. Ou melhor, um ser que a transportasse e a traduzisse.
Esse transporte de
ideias me lembrou o conceito de meme do Richards Dawkins no livro O Gene Egoísta,
antes do termo meme ser apropriado como ferramenta de expressão da internet com
gifs de gatinhos e montagens de humor.
Dawkins
acreditava que algumas ideias se reproduziam de forma semelhante aos vírus,
como modas do vestuário, melodias, ideias e slogans, tudo que pode ser
aprendido através da imitação.
Mas o auge da minha
surpresa foi numa disciplina sobre cibercultura, no mestrado, quando li
“Enquetes sobre os modos de existência” do francês Bruno Latour. O texto é pra
lá de cabeçudo e não tenho nenhuma pretensão de torná-lo acessível em um texto
no blog.
De maneira muito
resumida e simplória (põe simplória nisso), os modos de existência da política,
ciência, religião, do direito, da ficção, entre outros, possuem “chaves” de
existência que tem funcionamentos próprios.
Aqui surge o gancho que eu queria. Os seres da ficção EXISTEM.
Dentro do seu próprio modo. De alguma maneira.
Apaixonados por livros, personagens de séries, heróis dos
quadrinhos e filmes talvez entendam melhor o que quero dizer. Esses seres
constituem uma existência que lhe são próprias e eu gosto muito da ideia que
ela seja independente do autor.
Se uma história quando é contada ganha vida própria e
interpretações diversas, nada melhor que assumir a independência deles. Quantas
vezes eles já permearam nossas conversas, nossas roupas, nossas escolhas.
Minha torcida é para que esse seres sempre encontrem passagem
para o nosso mundo.
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